30 janeiro 2008

O poder imaginário das imagens

Imaginário das imagens O prazer estético, a arte como produção social capaz de dar visibilidade ao que nos cerca. O apreciador, contemplador, telespectador, que pode ressignificar o que vê pelo que percebeu do olhar do outro, como num jogo de espelhos, no qual o mundo se revela, é revelado e ganha novos tons e significados. Traz a escola como um espaço onde é possível propiciar o convívio e o diálogo entre o acervo imagético, trazido pelos alunos de sua experiência cotidiana, com as produções artísticas e culturais reconhecidas universalmente e pertencentes a diferentes épocas e contextos socioculturais.O texto de Ana Elisabete Lopes Doutoranda da PUC/Rio – em Psicologia nos faz reconstruir novas formas de aprender aprendendo utilizando o poder da imagem.

Sabemos ser vasto seu universo, portanto, compreendemos a imagem como a "representação de uma sensação ou a representação de um conceito, sendo possível classificá-la como algo ausente. Neste sentido, a imagem passa a ser um registro histórico, faz sobreviver o que representa" RAHDE (2000 p.19). Analisando nessa perspectiva podemos dizer que a imagem representada não poderá dizer tudo, uma vez que é o leitor quem realiza a integração da problemática de verdade no discurso e na proposta visual.
De certa forma trago neste espaço o relato de experiência na integra para que vocês façam suas conclusões.

Em 2006, quando o proje­to Ampliando Olhares com a Fotografia na Escola teve início na 6ª série do ensino fundamental do colégio Unificado, de Itapema (SC), eu estava realizando paralelamente, via internet, o curso Aprender fotografia fazendo, oferecido pelo Grupo de Pesquisas KBr/Kidlink e pelo Projeto Arte-Educar, com apoio do CCEAD da PUC-Rio. Esse curso contribuiu
consideravelmente como suporte teó­rico e prático às atividades vivenciadas.
Os alunos convivem diariamente com máquinas digitais de alta definição. Ainda assim, o interesse em conhecer o antigo é algo que os atrai e, por isso, uma pequena exposição de máquinas fotográficas antigas no pátio da escola marcou o início do projeto. A sensibilização ocorreu de forma lúdica. Cada aluno recortou uma pequena janela em uma folha de papel sulfite e explorou as imagens que o pequeno orifício enquadrava, posicio­nando-o em direção aos objetos e às paisagens ao seu redor.

Para entender como a fotografia surgiu, construímos uma câmara escura, no estilo do antigo lambe-lambe: uma caixa de madeira sem fundo, pintada de preto na parte interna, com um furo por onde a luz pudesse passar. Dentro da caixa foi feita uma moldura com papel vegetal, e a cortina foi confeccionada com TNT preto. A câmara, uma engenhoca divertida e interessante, ficou ótima. Conseguimos relembrar o processo da antiga máquina da praça e seus fotógrafos lambe-lambes. A imagem refletida ficava invertida e colorida, o que deixava os alunos ainda mais empolgados.
Na semana seguinte, eles trouxeram informações retiradas da internet sobre o assunto e também o material necessário para a confecção da câmara escura individual. Considerando o projeto de execução de Ana Maria Schultze, orientadora do curso Aprender fotografia fazendo, auxiliei os alunos na elaboração da caixinha. Com ela em mãos, foram para lugares iluminados capturar imagens. A maioria conseguiu enxergar a imagem, que demora alguns segundos até se formar, porque a retina precisa acostumar-se com a pouca luminosidade. Por causa disso, alguns acharam difícil de enxergar. Todo esse processo tornou-se significativo para que entendessem melhor a inversão da imagem, considerando os princípios da física, e o que ocorria dentro da caixinha e, depois, na pinhole.
Para compreendermos o que acontecia no escuro, construímos um laboratório portátil, uma maleta de madeira, na qual colocamos tudo em miniatura na devida ordem. O laboratório portátil serviu para exemplificar todo o processo para a turma e, na hora da exposição dos trabalhos, um aluno explicava-o aos visitantes, utilizando o laboratório para ilustrar sua explanação.

Como não tínhamos um espaço com pouca luminosidade adequado para instalar um laboratório, surgiu a alternativa de um laboratório desmontá­vel, acoplado ao tanque da sala de artes. Como o material fotográfico tem um custo alto, resolvemos fazer uma "vaquinha" de 3 reais por aluno para comprar os químicos, o papel fotográfico e os materiais para a montagem do laboratório fotográfico desmontável. Foram 50 reais para o laboratório (canos de PVC, luz vermelha e lona preta) e 125 reais para materiais fotográficos (químicos e papel fotográfico). O laboratório foi montado e desmontado quatro vezes no período das atividades pelos pró­prios alunos.
Segundo o professor Ênio Leite (2002),1 os fotogramas são, em uma definição genérica, imagens realizadas sem a utilização da câmera fotográfica, por contato direto de um objeto ou material com uma superfície fotossensível exposta a uma fonte de luz. Essa técnica nasceu junto com a fotografia e serviu de modelo a muitas discussões sobre a ontologia da imagem fotográfica, tendo sido profundamente transformada pelos artistas de vanguarda nas primeiras décadas do século XX. Com a evolução das câmeras fotográficas e o sur­gimento dos filmes de maior sensibilidade, o foto­grama desapareceu. Essa técnica também esteve presente nos movimentos surrealistas, da­daís­tas, cubistas, na bauhaus e até na pop art norte-americana dos anos de 1960.Iniciamos com os fotogramas em uma turma de 32 alunos. Quatro alunos por vez entravam no laboratório e completavam todo o processo. Eles trouxeram objetos pessoais, como brincos, correntes, chaves e moedas para realizar a atividade. As experiências que presenciaram foram os princí­pios da ação da luz sobre materiais fotossensíveis. Ao acender a luz branca, o papel ia lentamente escurecendo nas regiões expostas à luminosidade, enquanto permanecia mais claro nas áreas em que se projetavam as sombras dos objetos.
Após a exposição do papel à luz, era hora de revelar: a "hora do banho", como dizia um dos alunos. Iniciava-se o processo de revelação mergulhando o papel fotográfico na bandeja com revelador - e vibrávamos quando a foto começava a aparecer gradativamente dentro do reve­la­dor. Logo mergulhávamos o papel no interruptor (ácido acético) e, por último, no fixador, deixando-o por mais três minutos, até seu banho final, embaixo da torneira. Depois disso, as fotos ficavam pendurava no varal para secar. Como o cheiro dos químicos é forte, colocamos um ventilador para arejar.
Perguntei aos alunos se conheciam a máquina de lata, ou pinhole, como é conhecida nos Estados Unidos (em inglês, pin [alfinete] + hole [buraco]), mas poucos tinham ouvido a respeito. A maquina de lata tem até um dia comemorativo, quando milhares de pessoas saem às ruas para fotografar com suas pinholes. Mostrei a eles, usando o retroprojetor, uma reportagem sobre o assunto, e
todos ficaram animados para fazer uma.
Transformar uma simples lata em uma câ­me­ra que funciona de verdade e, além disso, revelar as fotos foi uma atividade mágica. Para construir a máquina pinhole, cada aluno trouxe o material necessário: uma lata bem vedada, papel alumínio, papel camurça preto. Na sala de artes, já havia materiais como martelo, pregos e agulha para fazer o buraco na lata, assim como tesoura e adesivos pra enfeitar a parte externa. Durante o processo de construção, a dúvida mais freqüente era em relação ao funcionamento. Com a máquina pronta, era chegado o momento de conversar sobre o papel fotossensível, pois este, juntamente com a luz, seria o maior responsável pelo aparecimento da fotografia.
Com a pinhole pronta, teríamos de colocar o papel dentro dela. Usamos uma câmara escura, utilizada ainda hoje para retirar os filmes das máquinas analógicas a fim de não velar ou queimar o papel com a luz natural. Cada aluno carregou a sua máquina com o papel 10x15 cm. Certificados de que o furo feito na lata estava devidamente fechado, todos saíram a campo para fotografar. Nesse caso, a foto precisa ser estudada antes de o buraco ser aberto, pois, uma vez que o buraco da lata seja aberto, a foto é tirada. Era necessários abrir o orifício da lata, que deveria estar posicio­nado em direção ao objeto a ser fotografado, e contar aproximadamente cinco “jacarés", técnica aprendida no curso on-line, cria­da por Ana Maria Schultze para tornar a atividade mais lúdica. A técnica é empregada para contar o tempo de exposição com a janela aberta, sendo a unidade de medida a palavra jacaré con­tada oralmente: um jacaré, dois jacarés, e assim por diante.Com o papel sensibilizado e a lata lacrada, os alunos entravam no laboratório para revelar a fotografia. Tendo cuidado e utilizando uma pinça, tiravam o papel de dentro da lata e observavam que ele permanecia branco. Então, repetiam o processo de revelação. Para ampliar o olhar dos alunos sobre a fotografia, apresentei-lhes o exemplar de uma revista de fotonove­las da década de 1970, com Tarcísio Meira e Glória Menezes na capa, o que eles acharam muito interessante. No laboratório de informática da escola, observamos na internet fotonovelas criadas por alunos da mesma série de outros colégios.
Iniciamos com a produção de um texto com tema livre, no qual os atores seriam eles próprios. Para isso, contamos com a professora Sandra Bittencourt, de língua portuguesa, que nos auxiliou com a revisão. A produção dos textos foi feita nas aulas de português e os story boards, nos quais constavam os diálogos e um esboço do que seriam as fotonovelas, foram feitos nas aulas de artes. Os alunos entregaram um CD contendo as fotos e os balões de fala, e o story board auxiliou a gráfica na hora de montar as histórias. Por opção deles, a impressão foi colorida. O projeto foi levado para a gráfica, que montou, editou e imprimiu as fotono­velas. Imprimimos apenas um exemplar, que foi custeado pela escola.
As etapas vividas nesse projeto foram compartilhadas com os colegas do curso via internet, oportunizando um aprendizado com base na vivência do meu grupo. Diversos comentários foram feitos e as dúvidas também foram sanadas on-line durante todo o projeto. Nos três meses de trabalho, os alunos conheceram aspectos da fotografia pinhole e digital, vivenciando situações de observador, fotógrafo, químico, expectador, escritor, editor e também ator.
Esse projeto promoveu experiên­cias interdis­ci­plinares com a física, no momento em que enten­demos como a luz é refletida em uma câmara escura; com a quí­mica, quan­do observamos o processo de revelação; com a língua por­tu­guesa, por meio da elaboração dos textos das fotono­­ve­­las, e com a arte, que esteve presente em todas as etapas, ou seja, no enqua­dra­mento, na sensibilidade para a escolha da imagem, na estética e na composição da fotografia.
Katyúscia Sosnowski é licenciada em Educação Artística, com habilitação em Artes Plásticas, e pós-graduada em Arte-Educação e Tecnologias Contemporâneas.
Fonte: Texto originalmente publicado na Revista Pátio Ano XI - Nº 43 - Histórias de vida e aprendizagem - Agosto à Outubro de 2007

6 comentários:

Jenny Horta disse...

Que projeto interessante e bem elaborado! Muito bacana e serve de exemplo para todos nós. Gosto muito de trabalhar a partir de imagens com meus pequenos e percebo que estimular a observação nas crianças é essencial para eles na fase da pré alfabetização.

Unknown disse...

Gostei de seu comentário. Bom saber que desenvolves atividades utilizando este recurso.Interessante seria socializar no CulturanaRede.
Abços e volte sempre!

Elis Zampieri disse...

Gostei do novo layout, mais de acordo com os padrões de acessibilidade também. Se quiser adequá-lo melhor, tem um post sobre isso lá no sobre educação...
Quanto ao seu post...que trabalho lindo! Isso que eu chamo de trabalho multidisciplinar!!! Realmente, como você mesmo comentou, o trabalho com as tecnologias digitais não pode ficar restrito ao computador, existe uma gama enorme de possibilidades a serem exploradas e este é um belíssimo exemplo.
Parabéns!

Anônimo disse...

Boa tarde!
Pôxa demorei um bocado para conseguir passar por aqui. Mas achei muuuuitíssimo interessante!!
Seu trabalho émaravilhoso!
Desejo sucesso!
[]'s

Unknown disse...

Thaiza!
Ainda fiquei te devendo uma visitinha lá no seu Blog!
Abços
Luiz

Sinclair Pisani Zotti disse...

Parabéns projeto muito interessante,que realmente deve ser divulgado, este é exemplo de educação democrática que tão objetivamos.